sexta-feira, 25 de fevereiro de 2011

Florbela Espanca: sinônimo de entrega...

Imagine-se em meio a uma tempestade catastrófica, quase apocalíptica, toda aquela agitação, o mundo virando do avesso. Imagine as sensações que isso lhe causaria, mas esqueça o medo... pense somente no estado de êxtase diante da magnitude do acontecimento; tente sentir como a vida lhe pareceria mais intensa.
Será que você pode sentir a força que isso teria, a intensidade que a vida passaria a ter?
Bem, ao ler certos poemas de Florbela Espanca, tenho a sensação que ela os escreveu no fervor dessa tal sensação que acabo de lhe dizer. Parece-me que, ao tomar papel e pena, deixava-se pensar estar nos últimos instantes de vida, tamanha intensidade que alguns de seus versos trazem.
E entregou-se. Entregou-se ao sentimento mais inevitável da vida, o amor. Cantou o amor, em seus versos, como se só houvesse aquele último segundo pra amar...
Como poderia viver alguém assim, de tamanha entrega?
Não pode...
Suicidou-se na data de seu 36º aniversário, a 8 de dezembro de 1930.
Não conheço todos os textos da poetisa (nem sequer posso dizer "muitos"), mas com o pouco que li, sinto-me habilitada para dizer que deixou uma obra magnífica para o nosso deleite (e põe deleite nisso!).

Eis minha pequeníssima seleção:



CRUCIFICADA
Amiga ... noiva... irmã... o que quiseres!
Por ti, todos os céus terão estrelas,
Por teu amor, mendiga, hei-de merecê-las,
Ao beijar a esmola que me deres.


Podes amar até outras mulheres!
— Hei-de compor, sonhar palavras belas,
Lindos versos de dor só para elas,
Para em lânguidas noites lhes dizeres!


Crucificada em mim, sobre os meus braços,
Hei-de poisar a boca nos teus passos
Pra não serem pisados por ninguém.


E depois... Ah! depois de dores tamanhas,
Nascerás outra vez de outras entranhas,
Nascerás outra vez de uma outra Mãe!


 
AMAR!



Eu quero amar, amar perdidamente!

Amar só por amar: aqui... além...
Mais Este e Aquele, ou Outro e toda a gente...
Amar! Amar! E não amar ninguém!

Recordar? Esquecer? Indiferente! ...
Prender ou desprender? É mal? É bem?
Quem disser que se pode amar alguém
Durante a vida inteira é porque mente!

Há uma Primavera em cada vida:
É preciso cantá-la assim florida,
Pois se Deus nos deu voz, foi para cantar!

E se um dia hei-de ser pó, cinza e nada
Que seja a minha noite uma alvorada,
Que me saiba perder... pra me encontrar...



SUPREMO ENLEIO


Quanta mulher no teu passado, quanta!
Tanta sombra em redor! Mas que me importa?
Se delas veio o sonho que conforta,
A sua vinda foi três vezes santa!

Erva do chão que a mão de Deus levanta,
Folhas murchas de rojo à tua porta...
Quando eu for uma pobre coisa morta,
Quanta mulher ainda! Quanta! Quanta!

Mas eu sou a manhã: apago estrelas!
Hás-de ver-me, beijar-me em todas elas,
Mesmo na boca da que for mais linda!

E quando a derradeira, enfim, vier,
Nesse corpo vibrante de mulher
Será o meu que hás-de encontrar ainda.



DE JOELHOS


‘Bendita seja a Mãe que te gerou. ’
Bendito o leite que te fez crescer.
Bendito o berço aonde te embalou
A tua ama, pra te adormecer!

Bendita essa canção que acalentou
Da tua vida o doce alvorecer...
Bendita seja a lua que inundou
De luz, a terra, só para te ver...

Benditos sejam todos que te amarem,
As que em volta de ti ajoelharem
Numa grande paixão fervente e louca!

E se mais que eu, um dia, te quiser
Alguém, bendita seja essa Mulher,
Bendito seja o beijo dessa boca! !



HUMILDADE


Toda a terra que pisas, eu qu’ria ajoelhada,
Beijar terna e humilde em lânguido fervor;
Qu’ria poisar fervente a boca apaixonada
Em cada passo teu, ó meu bendito amor!

De cada beijo meu, havia de nascer
Uma sangrenta flor! Ébria de luz, ardente!
No colo purpurino havia de trazer
Desfeito no perfume o mist’rioso Oriente!

Qu’ria depois colher essas flores reais,
Essas flores de sonho, entranhas, sensuais,
E lançar-tas aos pés em perfumados molhos.

Bem paga ficaria, ó meu cruel amante!
Se, sobre elas, eu visse apenas uma instante
Cair como um orvalho os teus divinos Olhos!

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2011

Esse também é meu...

Mal Necessário.

Rasga o peito a dor dos amantes não amados...
Pensamentos que recaem sempre no mesmo bem,  que se quer bem.
E os olhos ficam a procurar migalhas
Num chão completamente limpo...
Não há nada! Não há nada!
Mas é necessária a busca.
É necessário o sonho...
É necessário o delírio.
Para que se passe a dor é necessário que ela, antes, seja sentida...
Para que se possa chamar de feio, é imperativo que se tenha o bonito como contraponto...
Mas não há. Nem haverá...
Nem um...
Nem outro.
Só um vazio.
E florescem devaneios...
E brotam angústias... des-ne-ces-sá-rias.
O mundo gira...
É só mais um apaixonado
Que precisava rever o amor para, mais uma vez, aprender a esquecê-lo.

quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

Um "Mimo"...

Uma de minhas últimas paixões... Mário de Andrade.
Falo do crítico literário. Sim, pois do escritor propriamente dito, tenho que admitir que não conheço o suficiente para pôr-me apaixonada.
Mergulhando nessa sua faceta - a crítica literária - que é apenas uma das tantas em que Mário se desdobrou, tive o prazer de deleitar-me com as geniais considerações feitas no famoso Prefácio interessantíssimo, prefácio da obra Paulicéia desvairada.
Interessantíssimo mesmo!! Asseguro aos que o desconhecem. Considerações maravilhosas sobre a composição literária, teorias e conceitos engenhosamente construídos para sustentar o seu ponto de vista do que deveria ser o ato “criacional”...
Bem, a meu ver, tudo feito num equilíbrio...
Sabia ponderar, aquele Mário!
É, pois, desse prefácio que tirei a citação que acompanha o “mimo”, o marcador de páginas, a que se refere o título da postagem:

"click" para abrir em outra página e salve.
Que metáfora, ein? Emana o modernismo de Mário.
Então, fica a dica de leitura, não só do prefácio, mas também da obra. O marca páginas é só salvar e imprimir em papel 60kg.
Até a próxima postagem.

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Hora do deleite: Soneto do amor total - Vinícius de Moraes

Soneto do amor total

Amo-te tanto, meu amor... não cante
O humano coração com mais verdade...
Amo-te como amigo e como amante
Numa sempre diversa realidade

Amo-te afim, de um calmo amor prestante,
E te amo além, presente na saudade.
Amo-te, enfim, com grande liberdade
Dentro da eternidade e a cada instante.

Amo-te como um bicho, simplesmente,
De um amor sem mistério e sem virtude
Com um desejo maciço e permanente.

E de te amar assim muito e amiúde,
É que um dia em teu corpo de repente
Hei de morrer de amar mais do que pude.


Vinícius de Moraes.

sábado, 12 de fevereiro de 2011

Preciso dizer-lhe...

Preciso dizer-lhe que a beleza das coisas depende, e muito, de como você as observa; que tudo que aí está é muito relativo.
Preciso dizer-lhe que verdades absolutas não existem... Tudo é coisa de momento. E que mentiras podem ser verdades, dependendo, para isso, da sua capacidade de tolerar e imaginar.
Preciso dizer-lhe que ser sincero é “o que há”. Mas que, para tanto, é necessário ter, no mínimo, 50% de coragem e 30% de loucura na composição do ser.
Preciso dizer-lhe que a felicidade é resultado de um abobalhamento diante do mundo. Abobalhamento necessário! E que não é a largura do seu sorriso que atesta o quão você é feliz, e sim a forma como isso emana inexplicavelmente de você.
Preciso dizer-lhe que para falar de amor há de ter muita cautela. Eu não a tenho... Mas preciso dizer-lhes, também, que é necessário, às vezes, atrever-se a falar sem cautela para, só aí, entender a importância que ela tem.
Portanto, preciso dizer-lhe que amar, a meu ver, é algo de que se deve considerar, ao menos, duas vertentes: o amor que avassaladoramente vem e o amor que calmamente se vai buscar, construir. O primeiro te destrói, abala sua coerência; o segundo... também, porém de forma bem mais lenta, quase imperceptível.
E assim, preciso dizer-lhe que é imprescindível deixar-se destruir. Não há sabor mais agradável. E, de quebra, ainda existe a reconstrução.
Preciso dizer-lhe que o que é humano pressupõe um bem e um mal, que não se pode iludir-se com apenas uma das faces. E preciso dizer-lhe, ainda: Iluda-se! O fantástico da vida é poder sonhar. Mas que se tenha consciência que é sonho e que se saiba voltar.
Preciso dizer-lhe que não há nada mais lindo que o brilho do sol. Deve-se na vida, ao menos uma vez, deixar-se contemplar seu emergir e imergir no horizonte.
Preciso dizer-lhe, ainda, que é de madrugada que as coisas acontecem, que a vida é curta e que Deus, Ele sim, é Maravilhoso.
Preciso dizer-lhe, e isso é importantíssimo, que vivi relativamente pouco, que tudo que digo, aqui, tem grande possibilidade de já ser do seu conhecimento ou, mesmo, mero equívoco. Mas, ainda assim, preciso dizer-lhe.


quarta-feira, 9 de fevereiro de 2011

De quem é?

Bem...
Começo unindo boa leitura à "utilidade pública".
Dias atrás, encontrei um belo texto intitulado Desejo Primeiro, o qual enviei por e-mail a vários amigos com autoria dedicada a Sérgio Jockyman. Passados alguns dias, recebi de uma amiga da faculdade, Maria Eduarda, a resposta que o texto era realmente lindo e que já o conhecia, mas com autoria de Victor Hugo...
E agora?
Eis uma dúvida cruel que me tem perturbado... De quem será este bendito texto:

Desejo primeiro - ????

Desejo primeiro que você ame,
E que amando, também seja amado.
E que se não for, seja breve em esquecer.
E que esquecendo, não guarde mágoa.
Desejo, pois, que não seja assim,
Mas se for, saiba ser sem desesperar.
Desejo também que tenha amigos,
Que mesmo maus e inconseqüentes,
Sejam corajosos e fiéis,
E que pelo menos num deles
Você possa confiar sem duvidar.
E porque a vida é assim,
Desejo ainda que você tenha inimigos.
Nem muitos, nem poucos,
Mas na medida exata para que, algumas vezes,
Você se interpele a respeito
De suas próprias certezas.
E que entre eles, haja pelo menos um que seja justo,
Para que você não se sinta demasiado seguro.
Desejo depois que você seja útil,
Mas não insubstituível.
E que nos maus momentos,
Quando não restar mais nada,
Essa utilidade seja suficiente para manter você de pé.
Desejo ainda que você seja tolerante,
Não com os que erram pouco, porque isso é fácil,
Mas com os que erram muito e irremediavelmente,
E que fazendo bom uso dessa tolerância,
Você sirva de exemplo aos outros.
Desejo que você, sendo jovem,
Não amadureça depressa demais,
E que sendo maduro, não insista em rejuvenescer
E que sendo velho, não se dedique ao desespero.
Porque cada idade tem o seu prazer e a sua dor e
É preciso deixar que eles escorram por entre nós.
Desejo por sinal que você seja triste,
Não o ano todo, mas apenas um dia.
Mas que nesse dia descubra
Que o riso diário é bom,
O riso habitual é insosso e o riso constante é insano.
Desejo que você descubra,
Com o máximo de urgência,
Acima e a respeito de tudo, que existem oprimidos,
Injustiçados e infelizes, e que estão à sua volta.
Desejo ainda que você afague um gato,
Alimente um cuco e ouça o joão-de-barro
Erguer triunfante o seu canto matinal
Porque, assim, você se sentirá bem por nada.
Desejo também que você plante uma semente,
Por mais minúscula que seja,
E acompanhe o seu crescimento,
Para que você saiba de quantas
Muitas vidas é feita uma árvore.
Desejo, outrossim, que você tenha dinheiro,
Porque é preciso ser prático.
E que pelo menos uma vez por ano
Coloque um pouco dele
Na sua frente e diga `Isso é meu’,
Só para que fique bem claro quem é o dono de quem.
Desejo também que nenhum de seus afetos morra,
Por ele e por você,
Mas que se morrer, você possa chorar
Sem se lamentar e sofrer sem se culpar.
Desejo por fim que você sendo homem,
Tenha uma boa mulher,
E que sendo mulher,
Tenha um bom homem
E que se amem hoje, amanhã e nos dias seguintes,
E quando estiverem exaustos e sorridentes,
Ainda haja amor para recomeçar.
E se tudo isso acontecer,
Não tenho mais nada a te desejar.

Lindo mesmo, não é? Agora é hora de comentar... quem é o autor???