terça-feira, 16 de agosto de 2011

Marinheiro...


Marinheiro, onde navega teu barco?
Um coração em todos os portos...
Mais um para os tantos que já te esperam.
Vai, vai, Marinheiro!!
Ela ficará a balançar o lenço branco.
Vai, vai, marinheiro!!
Tua profissão é mesmo navegar.
E amar?
Amor é ofício de quem fica em terra.
Tu não tens culpa, marinheiro...
Tu nunca prometeste, sequer, regato...
Que dirá de um mar?

Solitário

Acordei e não havia nada.
Nem riso, nem choro, nem cheiro...
Havia vazio... Ela havia ido.
E eu?
Meu amor abandonado exatamente onde deixei... Exatamente como deixei: intacto.
Por que ela se foi assim?
E eu sentado à soleira da porta.
Minha mão ainda estava esperando a dela...
Pergunto: Por quê? Amá-la não era suficiente?
Agora, percebo-me só. Tão só como quando estive ao seu lado, mas estranhamente dói mais.
Ela poderia estar aqui! E isso não faria diferença... Mas, talvez, seja mesmo isso que quero.
Meu Deus! O que ela pensava quando olhávamos o pôr do sol? Era o mesmo horizonte?
Sinto que tudo está claro... ou não...
Eu poderia correr e implorar pelo mínimo que ela pudesse me dar. Sim... eu poderia...
Talvez, eu vá...
E as migalhas dela, talvez, me façam feliz.
Queria fechar os olhos e não vê-la, ainda, presa à minha retina... Mas não sou forte para tanto.
Hoje, acordei e tudo que havia era aquele amor...
No chão, ao lado daquelas coisas que ela deixou...
Coisas sem importância.

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

À queima-roupa

Eu via toda a destruição que eu poderia provocar.
Eu fui o mal da tua humanidade... eu sei.
Quando você me olhou e só viu infância, eu já sabia que teus olhos não tinham alcançado o que realmente sou... esse turbilhão, essa bagunça.
Quando você disse “você é linda”, eu já sabia que você não poderia ter visto tudo.
Eu já sabia que as minhas palavras não tinham alcançado a fiel significação.
Quando, nos teus olhos, eu vi, mesmo que falso, o engano, eu já sabia que eu iria te decepcionar...
Eu já sabia que eu iria destruir isso que você construiu e que pareceu tão bonito...
Eu sabia que, mais uma vez, eu seria um tiro à queima-roupa que dilaceraria todas as projeções...
Eu sinicamente sabia e, mesmo assim, deixei os dados rolarem.
A aposta, eu via, estava sendo alta... mas eu calei.
Mesmo sabendo que eu te faria perder toda a felicidade de conhecer um ser humano bom...
Eu nunca fui... mas me deixei passar.
Era tão fácil sonhar acordada no mundo real...
Mas eu sabia... eu não era nada daquele sonho...
Como um falso objeto, eu fui... Como algo que nunca fui, deixei-me parecer...
E, no fim... Ah, não houve um fim... eu te matei mesmo antes do adeus, eu perfurei o teu peito mesmo antes de te fazer sorrir...
Eu te dei a morte, mesmo antes que eu pudesse te mostrar que em mim não havia vida até você chegar...

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Insanidade...

Por que eles gritam, meu amor?
 O quarto é tão branco, o vento brando... e o mundo leve...
As enfermeiras usam branco também... é tudo tão limpo e os comprimidinhos, tão coloridinhos, trazem tanta paz...
Não sei por que eles gritam, meu amor...
A cama é macia, não tanto, mas dá pra sonhar... cheira bem...
Tudo cheira bem.
E...sabia que parei com aquela minha mania de chorar?
Não... não choro mais...
Eles ainda gritam, meu amor... por quê?
É tudo tão bonitinho... a grama é verde e o moço que nos vigia é tão educado...
Tanto... você nem sabe. Certa vez, ele me chamou de linda...
Linda... “Venha cá, linda, não é permitido entrar aí”. Ele falava de uma sala...
Eu nem ia entrar... mas ele disse “linda”...
Viu só, amor, “linda”!
Eu não entendo por que ainda tem quem grite...
Até a comida...é tão boa... sem sal, mas é boa...
Só não gosto porque não me dão talheres, sabia?  Só uma colher... uma bonita e útil colher...
Amor, não é reclamando, mas sinto falta de facas... Por que não me dão facas?
Foi você que pediu, amor?
Mais eu te prometi, amor... não vou mais fazer aquilo que fiz... eu prometi!
Ah, outro dia colocaram música pra gente ouvir, sabia?!... Lembrei de você...
De como você tocava pra mim...
Só não foi melhor porque uma moça gritava... eu não podia escutar todas as notas... nem todos os instrumentos...
Mas foi bom... era música...
Hoje percebi... você nunca mais veio me visitar...
Por quê?
Eu sei... você não gosta muito daqui, não é? Tem essa gente que grita...
Mas eu não grito, amor... não mais...
Quando você virá?
Você virá, não é?
Amor?

Anoitecer...

Eu podia ouvir o choro que havia em cada nota... em cada corda que vibrava, em cada letra das palavras que faziam a sua triste música...
Algo que falava de amor... um amor triste... um amor fraco, sem início nem fim...
E eu sentia enquanto ele tocava...
Fechava os olhos... privava o mundo do meu olhar, mortiço olhar...
Talvez ele não entendesse minhas reações...
Nem mesmo eu as entendia...
Nada eu podia fazer...  eram apenas a música, aquela música e nós...
Vez por outra, ousei abrir os olhos e observar...
Era como se ainda estivesse de olhos fechados...
Ele seguia... cada acorde suscitava uma lágrima que não se via, mas, é certo, caía...
E aquele amor, triste amor ia sendo lançado do vento... ecoava longe...
Lembro-me que deixei a cabeça pender e apoiar-se no punho cerrado...
Tudo parecia tão estranho... tão paradoxal...
Era tudo tão celeste e tão longe de Deus...
Sentia medo por não sentir medo...
Mas a música seguia... e a luz do sol, que já repousava no horizonte, ainda entrava pela janela...
Quando tudo se fez treva, o céu tornou-se um lugar possível... ao menos pra mim.